terça-feira, 15 de junho de 2010

Ayahuasca, Aspecto Geral

AyahuascaPlantas com propriedades alucinógenas vem sendo utilizadas com finalidades místicas e religiosas em diferentes culturas primitivas (Andritzky, 1989; Callaway, 1996; Desmerchelier, 1996; Luna, 1984). Há relatos do uso das poções em toda a Amazônia, chegando à costa do Pacífico no Peru, Colômbia e Equador, bem como na costa do Panamá, sendo que foi reconhecida em pelo menos 72 tribos indígenas, com pelo menos 40 diferentes nomes.
Entre as diversas tribos da bacia Amazônica, a Ayahuasca é percebida como uma poção mágica inebriante, de origem divina, que "facilita o desprendimento da alma de seu confinamento corpóreo", voltando ao mesmo conforme a vontade e carregada de conhecimentos sagrados. Entre os nativos é usada para propósitos de cura, religião e para fornecer visões que são importantes no planejamento de caçadas, prevenção contra espíritos malévolos, bem como contra ataques de feras da floresta.
Ayahuasca é um termo quéchua (ou quíchua), língua falada nos altiplanos andinos (Dobkin de Rios, 1972), cuja etimologia é: Aya – persona, alma, espíritu muerto; Waska – cuerda, enredadera, parra, liana, que poderia ser entendida, por exemplo, como “trepadeira das almas”. No Peru, encontrou-se o seguinte significado: “soga de los muertos”.
O chá da Ayahuasca consiste da infusão do cipó Banisteriopsis caapi e as folhas do arbusto Psycotria viridis. O uso – inicialmente restrito aos povos indígenas – passou a ser incorporado pelas civilizações e vilarejos da Amazônia Ocidental, surgindo o vegetalismo (medicina popular de civilizações rurais do Peru e da Colômbia, que mantém elementos antigos sobre plantas, absorvidos das tribos indígenas e influências do esoterismo europeu dos colonizadores) (Labate e Araújo, 2002) (Costa et. Al.).
Como já foi descrito, a ayahuasca é um chá, utilizado na América do Sul em rituais religiosos, cujo preparo envolve o cozimento de duas plantas: a Bansteriopis caapi que contém potentes inibidores da MAO, as beta-carbolinas (harmalina, harmina e tetrahidroharmina, THH) e a Psychotria viridiis, que contém grandes quantidades de um único agente psicodisléptico, o N,N dimetil triptamina (DMT) (Ott, 1994). A harmalina e a harmina são inibidores na MAO-A e o THH inibe a recaptação da serotonina, desencadeando um aumento da sua atividade central e periférica, facilitando a psicoatividade da DMT (McKenna et al., 1984; Heffter 1898, 1898; Holmstedt & Lindgren, 1967; McKenna, 1992; Callaway, 1994 a, b; Callaway et al., 1996; Callaway et al., 1999) (Marques e Palhates,2001).
“Outras plantas amazônicas também possuem DMT e são utilizadas por diversas tribos indígenas como um modo de experiência religiosa. Entre estas estão a jurema (Mimosa hostilis) e o yopo (Anadenanthera colubrina). A jurema é consumida na forma de chá, enquanto as sementes do yopo são maceradas e seu pó, consumido pela via intranasal (cheirado)”.
A utilização da ayahuasca, cujo uso religioso é legitimado juridicamente no Brasil desde 1986, vem crescendo nos centros urbanos nas ultimas décadas. A despeito desta difusão, pouso se sabe sobre seus efeitos nos estados emocionais (Santos, 2006).

Constituintes Ativos:
- N, N – dimetiltriptamina (DMT) presente na P. viridis e D. cobrerana;
- Carbolinas: harmina, harmalina, tetrahidroharmina – alcalóides presentes na B. caapi e potentes inibidores da enzima MAO-A.
• 200mL de chá de Ayahuasca possuem: 30mg de harmina, 10mg de tetrahidro-harmalina, 25mg de DMT.

Farmacocinética:
• O tempo para atingir a concentração máxima no sangue (Tmax) é
observada 1,5h após a administração;
• O tempo de meia-vida (T1/2) é atingido 259 min (~ 4,32h) após a ingestão;
• Início do efeito – 30 a 45 min após a ingestão;
• Os níveis basais voltam a normalizar após 360 min (6h).
P.S.: dados da média de todos os componentes do chá.

Mecanismo de Ação:
A DIMETILTRIPTAMINA - O dimetiltriptamina (DMT) é um potente alucinógeno quando usado por via parenteral na dosagem de 25 mg (McKenna et al., 1998). Sua ação é agonista dos receptores 5-HT1a, 1b, 1d e do 5-HT2a e 2c. Porém, por via oral, ele é inativado através da desaminação sofrida pela ação da enzima MAO intestinal e hepática. Os efeitos aparecem de 30 a 45 minutos, aproximadamente, e podem durar até quatro horas (Mckenna et al., 1998).(Costa et. al.)
AS CARBOLINAS - As ß-carbolinas têm propriedades alucinógenas (Caze-nave, 1996) e, portanto, contribuem para a atividade da bebida Ayahuasca. Como são inibidoras da MAO, as ß-carbolinas inibem a desaminação intestinal do DMT possibilitando a chegada deste ao cérebro, mesmo por via oral (Callaway et al. 1999). Além disso, elas ainda aumentam os níveis de serotonina, dopamina, norepinefrina e epinefina no cérebro. Os efeitos sedativos primários de altas doses de ß-carbolinas são resultantes do bloqueio da desaminação da serotonina (Cazenave, 1996). A tetra-hidro-harmina (THH) é a segunda ß-carbolina mais abundante no chá e atua como um fraco inibidor da recaptação do receptor 5-HT e inibidor da MAO, portanto, o THH pode prolongar a meia vida do DMT por bloquear a sua recaptação intraneuronal (McKenna et al., 1998). Por outro lado, a THH pode bloquear a recaptação neuronal da serotonina, resultando em altos níveis de 5-HT na fenda sináptica e pode atenuar os efeitos da ingestão oral do DMT por competir com os sítios receptores pós-sinápticos (McKenna et al., 1998) (Costa et. Al.).
Do ponto de vista farmacológico, a ayahuasca parece não produzir dependência fisiológica, nem induzir mudanças corporais crônicas capazes de desencadear tolerância (Schultes & Hofmann, 1979 apud Shanon, 2002; Shanon, 2002) (Santos, 2006). No entanto, a ayahuasca pode produzir uma forte fascinação em certas pessoas que tiveram experiências poderosas com a bebida, algo semelhante ao fascínio desenvolvido por alguns indivíduos em relação à música, questões intelectualmente interessantes, ou talvez em relação a uma paixão por outra pessoa e, em todos estes casos, “se a fascinação é positiva ou negativa, uma benção ou um vício, é responsabilidade de cada indivíduo julgá-la dentro do contexto de sua própria vida” (Shanon, 2002) (Santos,2006).
Obs.: O mecanismo de ação da Ayahuasca começa com a inibição da MAO pela harmina e, em menor grau, pela harmalina. Subseqüentemente, ocorre a ação do DMT produzindo um efeito alucinógeno, alterando a percepção da realidade na maioria dos usuários.

Efeitos:
A ação da bebida se deve, portanto, à interação das ß-carbolinas com o DMT presentes nas plantas, que juntas potencializam as propriedades alucinógenas de ambas isoladas, levando-se em consideração que as ß-cartolinas aumentem as concentrações de DMT.

- Efeito Agudo
Físicos: - náuseas;
- Vômitos;
- Diarréia;
- Também incluem: aumentos leves da pressão arterial, dos batimentos
cardíacos e incoordenação motora;
Psíquicos: efeitos subjetivos (são visões de imagens com os olhos fechados);
- Delírios parecidos com sonhos;
- Sensação de vigilância e mirações;
- Estimulação;
Obs.: A ação alucinógena é conhecida como “miração”, caracterizada por visões
de animais, “seres da floresta”, divindades, demônios, sensação de voar,
substituição do corpo pelo de outro ser, etc.

- Efeito Crônico (grandes quantidades)
Físicos: - náuseas;
- Vômitos;
- Diarréia;
- Mídriase;
- Hipertensão;
- Palpitação.
Os efeitos psíquicos mais freqüentemente relatados são:
- alterações no processo de pensamento, concentração, atenção, memória e julgamento;
- alteração na percepção da passagem do tempo;
- medo de perda do controle e do contato com a realidade;
- alterações na expressão emocional variando do êxtase ao desespero;
- mudanças na percepção corporal;
- alterações perceptuais atingindo vários sentidos, onde alucinações e sinestesias são comuns;
- mudanças no significado de experiências anteriores - “insights”;
- sensação de inefabilidade;
- sentimentos de rejuvenescimento;
- hiper sugestionabilidade;
- sensação da “alma se desprendendo do corpo“;
- sensação de contato com locais e seres sobrenaturais.
Como é descrito para muitas outras substâncias psicoativas, e em especial para os alucinógenos, a experiência de usar Ayahuasca é influenciada pelas expectativas do indivíduo, setting, experiências prévias. (Costa et. al.)

Considerações Finais
• O mecanismo de ação da Ayahuasca começa com a inibição da MAO pela harmina e, em menor grau, pela harmalina. Subseqüentemente, ocorre a ação do DMT produzindo um efeito alucinógeno, alterando a percepção da realidade na maioria dos usuários.

• Considerando a complexidade da ação destas substâncias, o pequeno número de estudos metodologicamente adequados, com amostras não representativas, e sem seguimento longitudinal de usuários, tendo em vista algumas evidências quanto ao desenvolvimento de tolerância com o uso crônico e alterações de consciência com o uso agudo, pode-se concluir que não existe uso seguro destas substâncias pscicoativas, e que elas podem interagir com outras substâncias provocando intoxicações graves.

• Existem evidências que o consumo regular (tipicamente 2x/semana) leva a um aumento da densidade dos sítios de ligação de [3H]citalopram nas plaquetas, o que sugere uma compensação neurofisiológica para os aumentos periódicos nos níveis de serotonina. Portanto, a tolerância pode ser desenvolvida com o uso regular e crônico da bebida, provocando alterações na concentração dos neurotransmissores e receptores, especialmente na via da 5-HT, configurando-se em mais um risco de interação com substâncias que também atuem nestas vias. O exemplo desta evidência é a síndrome serotoninérgica.

• Como já foi dito, não dispondo de estudos controlados e randomizados e amostras adequadas, não foi possível concluir que a substância possa ser dependógena até o presente momento.

• Outro ponto que merece atenção é que o potencial de efeitos adversos permanece até por 5 semanas após a descontinuação do uso de um ISRS.

• Uma investigação oficial das religiões baseadas no uso da ayahuasca no Brasil foi realizada pela Dimed (Divisão de Medicamentos) e Confen (Conselho Federal de Entorpecentes), levando à legalização que protege o uso da Ayahuasca no Brasil para propósitos religiosos em agosto de 1987, sendo que nenhuma recomendação foi feita para alertar dos riscos dos aspectos descritos acima. É preciso redimensionar o documento, levando-se em consideração as evidências dos estudos em desenvolvimento.

• Não existe uso seguro de substâncias psicoativas e psicotrópicas e seu uso agudo e crônico pode levar a alterações do SNC, e consequentemente da cognição. Assim, o uso deve ser mais restrito aos rituais religiosos, ficando seus participantes responsabilizados por problemas advindos deste consumo.

• Não há nenhum relato científico demonstrando a possibilidade do uso terapêutico da Ayahuasca. Logo, tal conduta incide em má prática médica e deve ser evitada.

Há relatos da expansão do uso descontextualizado da Ayahuasca, por meio do “Ayahuasca tourism”, que podem ser acessados pelos sites específicos da Internet. Sabe-se também, que o aumento da disponibilidade pode levar a um aumento do consumo e problemas relacionados. (Marques e Palhares,2001)

Exames de detecção:
• Cromatografia gasosa – urina, plasma.

Referencias Bibliográficas:
- http://www.pumashamanicjourneys.com/index.php?page=trips
- http://psicoativas.ufcspa.edu.br/vivavoz/revisoes/ayahuasca.pdf
- Marques, Profª Drª Ana Cecília; Palhares, Hamer Nastasy. O uso da Ayahuasca e a necessidade de se reavaliar o consumo, o controle e as freqüentes denúncias de uso descontextualizado da bebida, novembro 2001.
- Costa, Maria Carolina Mere; Figueiredo, Mariana Cecchetto; Cazenave, Silvia de O. Santos. Ayahuasca: Uma abordagem toxicológica do uso ritualístico, Revista de Psiquiatria clínica.
- Santos, Rafael Guimarães. EFEITOS DA INGESTÃO DE AYAHUASCA EM ESTADOS PSICOMÉTRICOS RELACIONADOS AO PÂNICO, ANSIEDADE E DEPRESSÃO EM MEMBROS DO CULTO DO SANTO DAIME. Instituto de Psicologia, Universidade de Brasília, 2006.
- VIVAVOZ; Fonte: SISP; Versão 1.0 2006; AYAHUASCA.
Postado: Por Lucas de Castro e Daniel Sartori.

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